Cartografia dos afetos cinematográficos no lugar-escola de educação infantil - entre o humano e o não humano, entre o registro e a arte

A pesquisa é um desdobramento do Projeto de pesquisa e extensão “Lugar-escola e cinema: afetos e metamorfoses mútuas” e está articulada em torno de cinco grandes eixos.
O primeiro deles, mais empírico, é a grande quantidade de materiais gerada pela coordenação e acompanhamento, durante os dois últimos anos, do referido Projeto, realizado com seis bolsistas profissionais da educação infantil de duas escolas públicas na periferia da cidade de Campinas-SP (mais de 150 pequenos filmes, arquivo com centenas de filmagens não utilizadas, diários de campo de cada um dos sete integrantes – cinco mulheres e dois homens, cartas trocadas entre as/os bolsistas e integrantes do “Programa Cinema e Educação” da SME-Campinas, gravações de reuniões semanais realizadas no google meet durante o período da “escola fechada”, centenas de mensagens no grupo de whatsapp “Cineclube Regente/Cha”, cartografias dos afetos do conjunto de filmagens realizadas por adultos e crianças, ensaios e artigos acadêmicos publicados – muitos deles em coautoria com as/os bolsistas, três relatórios gerais e doze relatórios individuais, etc).
Outros três eixos, mais conceituais, buscam dar sustentação e continuidade às experimentações, análises e cartografias que já foram realizadas durante o “Projeto Lugar-escola e cinema” a partir de conceitos e autores/as que se amparam em maior ou menor grau nas Filosofias da Diferença, especialmente o conceito de lugar da geógrafa Doreen Massey (encontro aberto entre uma constelação singular de trajetórias heterogêneas humanas e não humanas); para além dele, nos ampararam as proposições sobre a importância do entorno na composição do “humano de espécie” de Fernand Deligny, os “corpos-câmera” de César Leite, a defesa da escola como “espaço e tempo livres” de Jan Masschelein e Maarten Simons, as proposições sobre “comunidade de cinema” de César Guimarães e os dispositivos de criação de imagem de Cezar Migliorin.
Estes dois últimos amparos, a “comunidade” e os “dispositivos”, vêm sendo desdobrados nos recentes estudos e experimentações sobre/com “cinema de grupo” realizados pelos integrantes do Kumã-Laboratório de Pesquisa e Experimentação em Imagem e Som, os quais se configuram como o segundo eixo do Projeto que aqui se propõe, visando focar nos “afetos cinematográficos” das trajetórias humanas (Massey, 2008) que compõem os lugares-escolas específicos onde se realizarão as novas experimentações com cinema propostas neste Projeto.
O terceiro eixo é um desdobramento das proposições de Doreen Massey e Fernand Deligny sobre a vida/vivacidade das trajetórias/presenças não humanas no lugar/entorno e será composto pelo estudo e utilização conceitual das filosofias ameríndias – especialmente as ideias para adiar o fim do mundo presentes nas falas e escritos de Ailton Krenak e as ideias para evitar a queda do céu presentes nas proposições de Davi Kopenawa – para pensar os “afetos cinematográficos” das trajetórias não humanas que também compõem os mesmos lugares-escolas.
O quarto, não menos importante, será composto pelos estudos sobre “documentação pedagógica na educação infantil”, um campo que aponta para conexões instigantes entre registros e arte na proliferação de novas práticas educativas, docentes e discentes, neste nível da educação básica.
O quinto e mais central eixo da pesquisa retoma a metodologia e o acompanhamento empírico em escolas de educação infantil, com novas experimentações com cinema a partir dos dispositivos de criação de imagens (e sons) pautados na intensificação do devir em comum – acabar juntos! – e dos afetos não humanos como forças de criação de um cinema que participe da experimentação de práticas educativas e modos de vida em que o heterogêneo, os outros, humanos e não humanos, proliferem e vivifiquem a escola, o cinema e a infância.
Desta forma, pretende-se atuar em dois “problemas” da educação contemporânea através da invenção e experimentação empírica de outros tipos de atenção ao entorno educativo, ao cotidiano, ao lugar-escola: 1. a constituição do comum como uma comunidade (dissensuada) de cinema, tendo em vista uma sociedade cada vez mais democrática e plural e 2. o reconhecimento e a valorização das outras formas de vida não humanas que compõem cada lugar-escola (a cidade e o planeta) tanto quanto a vida humana, tendo em vista a constituição de uma sociedade cada vez mais sensível a formas de vida mais sustentáveis ambientalmente.