Avatar

Rede Kino

Filiação Institucional:
Email: redekino2009@gmail.com
Currículo:

CARTA DE OURO PRETO 2024

A Mostra de Cinema de Ouro Preto e a Rede Kino – Rede Latino-Americana de Educação, Cinema e Audiovisual promoveram uma ampla consulta pública remota, prévia ao encontro presencial, para atualizar e ampliar a proposta de regulamentação da Lei Federal 13.006/14, que determina a exibição de duas horas de cinema brasileiro por mês nas escolas da educação básica. Foi elaborado um formulário que foi respondido por uma comunidade formada por educadores, gestores públicos, cineastas, profissionais da preservação, pesquisadores, professores e interessados na implementação de uma política pública que garanta a implementação da Lei. A partir das respostas recebidas, foram criados quatro Grupos de Trabalho (GTs) presenciais durante a 19ª CineOP. Contando com a participação de profissionais da cultura, da educação e representantes do Ministério da Cultura (MINC), representantes do Ministério da Educação (MEC) e Ministérios dos Direitos Humanos (MDH), os Grupos de Trabalho elaboraram um documento com uma proposta que visa contribuir com parâmetros e diretrizes para a construção de um Programa Nacional de Cinema na Escola.

A discussão pública do Programa foi dividida, portanto, em duas etapas. Na primeira etapa, realizada previamente, houve a ação online com a consulta para atualizar e ampliar a proposta de regulamentação da Lei 13.006/14. As questões do formulário visaram construir coletivamente um documento que apontasse os elementos necessários para as práticas cinematográficas nos contextos escolares, respeitando a diversidade dos territórios e valorizando a circulação das culturas e dos filmes que compõem o país. A Segunda etapa idealizada foi a ação presencial com a instituição dos quatro Grupos de Trabalho (GTs), constituídos em torno dos seguintes temas: Formação docente; Condições de produção e exibição; Acervos e curadorias; e Pedagogias.

Por meio de um edital próprio, o público da Mostra pôde se inscrever para tomar assento nos quatro GTs. Além dos GTs, foram inseridos na programação do evento debates abertos ao público. As reuniões dos GTs aconteceram nos dias 19 e 20 de junho, em Ouro Preto.

Sobre a metodologia adotada pelos GTs, no dia 19 de junho, primeiro dia de trabalho, os GTs se encontraram no auditório do Encontro da Educação para uma apresentação inicial sobre a dinâmica de trabalho e, na sequência, cada GT se reuniu separadamente para sistematizar as principais questões resultantes do levantamento da ampla consulta pública que orientou o debate nesse primeiro momento. Já no dia 20 de junho, segundo dia de trabalho, as sessões foram iniciadas com a apresentação das principais questões resultantes da sistematização dos debates do dia anterior. Foi feito um novo debate com adensamento das questões apresentadas no primeiro dia e elaboração de pontos que sintetizam a discussão. Abaixo apresentamos os resultados resumidos das contribuições e debates que serão sistematizados para o documento final da proposta para um Programa Nacional de Cinema na Escola a ser endereçada ao Ministério da Cultura, ao Ministério da Educação, Ministério de Direitos Humanos, Secretaria de Comunicação e demais representantes do governo implicados no assunto.

Para que a elaboração do Programa Nacional de Cinema na Escola se torne efetiva, chamamos atenção para as seguintes Diretrizes e Objetivos Estratégicos resultantes do processo coletivo acima descrito:

  1. Articulação do Programa Nacional do Cinema na Escola às Políticas Educacionais e Audiovisuais do Brasil

Promover políticas de formação, produção, distribuição/circulação, exibição e preservação audiovisual que dialoguem com as políticas da educação, cinema e audiovisual e garantam o acesso e a acessibilidade do cinema brasileiro independente nas escolas. Contribuir de forma maciça com as principais políticas do MEC para Educação Básica, a saber: Compromisso Nacional Criança Alfabetizada; Programa Escola em Tempo Integral; Estratégia Nacional de Escolas Conectadas; ampliação das vagas em creches, pré-escola e novos estabelecimentos de educação infantil, por meio do Educação Infantil Manutenção (EI Manutenção); criação de

grupos de trabalho interfederativos para debater os anos finais do ensino fundamental e a recomposição da aprendizagem; e envio ao Congresso Nacional do Projeto de Lei n. 5.230/2023 sobre a Política Nacional do Ensino Médio, assim como o diálogo com as diretrizes, objetivos estratégicos e programas do Plano Nacional de Cultura, das políticas do Cinema e Audiovisual brasileiro e seus respectivos responsáveis, como a Secretaria do Audiovisual do MinC, a ANCINE e o Conselho Superior de Cinema.

  1. Democratização de Práticas Pedagógicas com Cinema

Incentivar práticas pedagógicas diversificadas com o cinema para proteger e promover a diversidade cultural de todos os grupos étnico-raciais e suas derivações sociais, reconhecendo a abrangência das noções de educação, escola, cinema e audiovisual, em todo o território nacional, envolvendo professores, estudantes e toda a comunidade escolar, para garantir a multiplicidade de valores, formações e colaborar com a consolidação da democracia brasileira.

  1. Integração e Transversalização do Cinema às Políticas Educacionais

Incorporar o cinema aos currículos e projetos político-pedagógicos, preservando a autonomia das unidades escolares e processos educativos. Reconhecer o cinema em seus múltiplos modos, como comunicação, linguagem, arte e cultura, e transversalizar sua presença nos documentos oficiais de educação, articulando-o aos demais componentes curriculares de forma inter e transdisciplinar.

  1. Acesso Universal e Acessibilidade Integral

Assegurar as condições integrais para a produção e difusão acessível do cinema brasileiro e latinoamericano nas escolas, garantindo a conectividade e o acesso a obras, materiais e tecnologias audiovisuais com recursos assistivos, proporcionando a inclusão de todos os

estudantes no universo cinematográfico e garantindo o direito universal à educação de qualidade.

  1. Inserção na Escola em Tempo Integral

Garantir a implementação de práticas pedagógicas com o cinema nas escolas de tempo integral, oferecendo experiências diversificadas para os estudantes, assistência técnica, formação e condições de trabalho adequadas para os profissionais da educação.

  1. Articulação das políticas do Cinema, Audiovisual e Educação à Cultura Digital

Defender e priorizar a adoção de tecnologias não proprietárias visando à soberania digital brasileira e integrar as metodologias e pedagogias do cinema, audiovisual e educação ao Plano Nacional de Educação Digital e à Estratégia Nacional Escolas Conectadas, com vistas a estabelecer uma relação ética com as tecnologias digitais,como a realidade virtual e a inteligência artificial.

  1. Fomento a Redes de Plataformas Regionalizadas e Participação nos Acervos Nacionais

Fomentar redes regionais e plataformas de cinema e educação com equipes multidisciplinares, focadas na promoção e difusão de práticas educativas territorializadas com o cinema nas escolas e na formação docente, bem como garantir a participação da produção audiovisual escolar nos acervos públicos, repositórios e plataformas oficiais brasileiras.

  1. Desenvolvimento de Processos Colaborativos

Implementar ações de produção e difusão do cinema na escola por meio da constituição de processos colaborativos e a articulação de saberes interdisciplinares e transdisciplinares, integrando gestores culturais e escolares, docentes, estudantes, curadores, artistas,

pesquisadores, profissionais de saúde mental, agentes comunitários para construir pontes entre as escolas e ambientes de cinema, cultura e arte, como festivais e mostras, salas públicas de exibição, cinematecas e cineclubes e os variados equipamentos que compõem o ecossistema de cultura e arte no país em compromisso com a dimensão ética, estética e política da educação.

  1. Formação Docente com Experiências Cinematográficas

Garantir que a formação inicial e continuada dos docentes inclua experiências diversificadas com cinema, desde cineclubes até disciplinas obrigatórias sobre cinema e educação, bem como incentivo à criação de cursos de licenciatura em cinema, em consonância com as possibilidades e condições dos contextos e das instituições formativas.

  1. Produção de Tecnologias Locais e Sustentáveis

Estimular a produção de tecnologias locais empregando materiais sustentáveis com menor impacto ecológico, desenvolvendo soluções latino-americanas inclusivas e adaptadas às especificidades locais.

Ao longo do evento, que contemplou ainda cinco mesas de projetos audiovisuais educativos realizados em diversos estados brasileiros e em países da América Latina e Europa, duas sessões de filmes feitos em escolas, duas Masterclass internacionais, ficou evidenciado que a experiência do cinema nas escolas representa hoje, mais do que nunca, uma maneira de garantir a imaginação de novos mundos em comum, a escuta sensível, o respeito à diferença e uma ação de cuidado e questão de saúde pública. Essas potencialidades do cinema foram identificadas como uma saída para a defesa de uma sociedade democrática em que exista espaço para as produções subjetivas individuais e das grupalidades que residem nas escolas. A partir de uma série de exemplos que foram exemplificados na descrição de práticas de projetos de abordagens distintas foi detectada a urgência da garantia de experiências formativas com o cinema para que, por meio do acesso à educação e ao cinema, as crianças, os jovens e seus professores possam resistir contra discursos que promovem o ódio, o extermínio da diferença e a dissolução da experiência da presença.

Fica registrada ainda a solidariedade da Rede aos colegas da Argentina que enfrentam neste momento histórico o combate a um governo de extrema direita que impõe a perseguição à educação e à cultura, esgarçando a vida democrática e o pacto civilizatório que deveria sustentar a dignidade das pessoas e da vida em sociedade. Acreditamos que só o investimento em uma educação de qualidade social possa nos fazer trilhar outros caminhos que estejam direcionados para o bem viver. Sabemos que o cinema é hoje um importante aliado nesse sentido e, por isso, convocamos representantes do governo a trabalharem juntos em prol de uma política pública de estado para o campo do cinema e da educação.


Ouro Preto, 24 de junho de 2024.

Rede Latino-Americana de Educação, Cinema e Audiovisual

CARTA DE OURO PRETO 2023

XIV Fórum da Rede KINO – Rede Latina Americana de Educação Cinema e Audiovisual

A Rede Kino – Rede Latino-Americana de Educação, Cinema e Audiovisual – foi fundada em agosto de 2008. Atualmente, constitui-se por 184 representantes da sociedade e articula ações que envolvem todas as regiões brasileiras, tendo representação também na Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Cuba, Uruguai, México e Peru.

A pluralidade, diversidade e amplitude da Rede se expressam nos Fóruns anuais de Cinema e Educação que vêm ocorrendo na Mostra de Cinema de Ouro Preto, CineOP. Neste período foram apresentados mais de 100 projetos de educação audiovisual digital e analógica vinculados a universidades, organizações da sociedade civil sem fins lucrativos, secretarias estaduais e municipais de educação e cultura, escolas, territórios de fronteira, espaços de saúde, cineclubes, escolas do campo, quilombos e aldeias indígenas. Parte significativa dessa produção está densamente debatida no âmbito acadêmico e nos mais de 40 livros impressos e um número ainda maior de ebooks lançados apenas nos últimos três anos.

Um total de mais de 180 filmes produzidos nesses contextos foram apresentados nas Mostras KINO ao longo dos últimos anos. Essas obras são selecionadas a partir de chamadas públicas para toda América Latina, o que revela a existência de um universo mais vasto de realizações audiovisuais produzidas. Destacamos que essas experiências atravessam todos os níveis de ensino, promovendo práticas pedagógicas que articulam o cinema e as tecnologias digitais com a singularidade de cada território, instigando professores, funcionários, estudantes, famílias e comunidades na construção compartilhada de conhecimento.

Ao longo dos últimos 15 anos, a Rede KINO produziu 13 cartas como esta, documentos propositivos que apontam para a consolidação de políticas públicas para a educação, cinema e audiovisual e denotam a relevância da Rede no fomento de programas, projetos e ações em todo o Brasil, bem como em outros países da América Latina. Nestas linhas de ação ressaltamos: 1) participação no GT de discussão para a regulamentação da Lei Federal 13.006 de 2014, que determina a exibição de duas horas de filmes brasileiros por mês nas escolas e cujo texto final foi entregue ao Conselho Nacional de Educação em 2016; 2) realização de curadorias de obras audiovisuais com vistas à constituição de um Acervo Audiovisual Escolar Livre, em português e espanhol; 3) formação de novas audiências críticas e atentas a cinemas diversos e acessíveis; 4) invenção, implementação e acompanhamento de práticas pedagógicas integradas à obrigatoriedade do ensino de história afro-brasileira e indígena; 5) formação de professores e estudantes em todos os níveis e modalidades de ensino, com atenção à diversidade étnico-racial e de gênero, visando à produção de tecnologias audiovisuais acessíveis, com atenção às populações mais vulneráveis.

Neste ano, centralizamos nossos esforços na leitura crítica e criativa da Política Nacional de Educação Digital, instituída em janeiro de 2023, a partir da publicação do livro Cinema e educação digital: A Lei 14.533 – Reflexões, perspectivas e propostas. Nesse sentido, o XV Fórum da Rede Kino tomou este debate como eixo articulador de seus debates.

Nosso diagnóstico revela a necessidade de uma Política Nacional de Educação Digital – PNED – que inclua o audiovisual como um de seus eixos estruturantes, tendo em vista que 82% do conteúdo digital que circula na internet é audiovisual. Dessa forma, com base em nossa experiência, um eixo audiovisual atua na transversalização, descentralização e territorialização da educação digital em todo o Brasil, tendo potencialidade de incentivar a adoção de leis e políticas semelhantes em outros países latino-americanos.

Nessa perspectiva, defendemos uma PNED que garanta o acesso básico da escola pública a equipamentos, formação e tecnologias assistivas e, especialmente, uma educação digital crítica alinhada a processos criadores e inventivos de mundos mais justos, menos desiguais e menos violentos. Vale ressaltar que a educação digital precisa ser elaborada em articulação com a educação analógica sem de modo algum suplantá-la.

Pensamos, portanto, uma educação digital que não sirva estritamente aos interesses de uma inovação industrial e mercadológica, à compra e venda de novos aparelhos tecnológicos, forçando uma obsolescência programada com impactos ambientais irreversíveis e um excessivo consumo de energia que coloca em risco a sustentabilidade da vida planetária.

Queremos um digital que nos aproxime e fomente a invenção de um comum, promovendo o intercâmbio de saberes, sempre localizados e provisórios, nunca universalizantes. Uma educação digital que seja, ela mesma, pensamento sobre a tecnologia e seus processos subjetivantes.

Desta forma, a Rede Latino Americana de Educação, Cinema e Audiovisual se posiciona como interlocutora legítima e qualificada dirigindo-se às instâncias federais abaixo relacionadas para construirmos juntos uma Política Nacional de Educação Digital:

Ministério da Educação (MEC)
Ministério da Cultura (MinC) | Secretaria do Audiovisual Agência Nacional de Cinema (Ancine)
Rede Nacional dos Pontos de Cultura
Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) Ministério das Comunicações (MCom)
Ministério das Relações Exteriores (MRE)
Ministério de Direitos Humanos e da Cidadania (MDH) Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) Ministério dos Povos Indígenas (MPI)
Ministério da Igualdade Racial (MIR)
Ministério das Mulheres
Congresso Nacional

Ainda que tenhamos destacado aqui instâncias da administração federal do Estado Brasileiro, onde a Lei encontra-se em discussão neste momento, entendemos que a educação digital implica um pensamento sem fronteiras, envolvendo todas as demais esferas administrativas e seus agentes públicos e privados, bem como toda a sociedade civil. Neste sentido, defendemos a atuação de membros da Rede Kino na problematização, formulação, implementação e avaliação de políticas públicas que garantam uma educação digital efetivamente justa, diversa, inclusiva e democrática.

Ouro Preto, 25 de junho de 2023
Rede Latino-Americana de Educação, Cinema e Audiovisual

CARTA DE OURO PRETO 2022 [PT] / [ES]

CARTA DE OURO PRETO 2022  :: português // castellano

XIV Fórum da Rede KINO – Rede Latina Americana de Educação Cinema e Audiovisual

“Vamos falar sobre essa presidência, para o meu povo só traz violência”, cantou Daniel Damas, jovem negro, Mc, estudante e aluno de um dos vários projetos apresentados nesta edição dos encontros KINO, ecoando a voz de muitos povos indígenas que estiveram reunidos na 17ª Mostra de Cinema de Ouro Preto, 14ª Fórum da Rede KINO – Rede Latina Americana de Educação Cinema e Audiovisual.

As ressonâncias da violência podem fazer um corpo arder em ódio, um ódio genuinamente expresso por Johnn Nara Gomes, que ao exibir o filme-luto Ava Yvy Vera na  17˚ Mostra de Ouro Preto vivia um novo luto pelo assassinato de parentes Kaiowá acontecido às vesperas desta Mostra Homenagem. Um ódio, portanto, que não precisa de um pedido de desculpas, porque é a potência desse corpo afetado que reage, cria, se faz coletivo e compartilha modos de vida que resistem e lutam para existir.

As imagens dos filmes assistidos e dos projetos educativos apresentados nos colocaram diante de modos diversos do cinema funcionar no encontro com situações formativas, apontando a pertinência do plural, CINEMAS e EDUCAÇÕES, para aquilo que emerge como práticas e experiências, como imagens e sons, como montagens e políticas.

Contagiados por essas forças, os encontros da KINO desta edição – compostos por pessoas e filmes indígenas, brasileiros, argentinos, peruanos e bolivianos – nos permitiu reconhecer a potência da rede na conexão de nossos trabalhos e lutas, bem como propor uma coordenação latino americana e um programa de ação da Rede KINO, sintetizado nos seguintes pontos:

  • Mapear obras audiovisuais e difundir o Acervo Audiovisual Escolar Livre, criando percursos pedagógicos, permitindo que o cinema realizado na América Latina, em suas diversas matrizes, contextos, línguas e formas de expressão, possa ser partilhado em todos os espaços-tempos de educação, legendados e dublados para favorecer a acessibilidade com todas as formas de tecnologias assistivas.
  • Colaborar com a transformação do imaginário colonizador historicamente instaurado e dar lugar à diversidade pluricultural que constitui nossos povos, por meio da difusão de seus filmes nas escolas e universidades. Filmes que expressam alternativas ao projeto capitalista global e se efetivam como documentos fundamentais para a preservação e transmissão da memória dos nossos povos.
  • Fortalecer a produção acadêmica do campo da educação, cinema e audiovisual, demonstrando a singularidade do pensamento latinoamericano e construindo novas  alianças entre educadores dos diferentes níveis de ensino, com o intuito de forjar novos horizontes teóricos e conceituais, e outras epistemologias.
  • Construir Grupos de Trabalho para retomar, institucionalmente, a discussão de políticas públicas para a educação, cinema e audiovisual, como a regulamentação da Lei 13.006/14, assim como a regionalização de programas de cooperação nos níveis municipal, estadual e federal.
  • Ampliar a circulação dos projetos ligados à Rede Kino e de seus integrantes, permitindo um intercâmbio entre as universidades, grupos de pesquisa, escolas, metodologias, saberes, imagens e sons, dando a ver a amplitude da rede e das ações já existentes.
  • Expandir a atuação da Rede Kino ao articular os festivais e programas de cinema e educação na perspectiva de um pensamento que seja menos demarcado pelas fronteiras modernas definidas pelos Estados-Nação e mais orientado pelas alianças – culturais, políticas, institucionais etc – construídas a partir da própria capilaridade da rede.

Assim reafirmamos que o afeto da amizade como sustento inicial da rede torna-se seiva que se expande e frutifica no rizoma que a Kino é.

______________________________________________________________________________

“Hablemos de esta Presidencia, para mi pueblo sólo trajo violencia”, así cantó Daniel Damas, joven negro, Mc, estudiante y alumno de uno de los varios proyectos presentados en esta edición de los encuentros KINO, haciéndose eco de la voz de muchos pueblos indígenas que se dieron cita en el 17º Festival de Cine de Ouro Preto, 14º Foro de la Red KINO – Red Latinoamericana de Cine y Educación Audiovisual.

Las resonancias de la violencia pueden hacer arder un cuerpo de odio, odio genuinamente expresado por Johnn Nara Gomes, quien, al proyectar la película de duelo Ava Yvy Vera en la 17ª Mostra de Ouro Preto, vivía un nuevo duelo por el asesinato de sus “parientes” Kaiowá que tuvo lugar la noche anterior a dicho Homenaje. Un odio, por tanto, que no necesita disculpas, porque es justamente la potencia de un cuerpo afectado que reacciona, crea, se colectiviza y comparte formas de vida que resisten y luchan por existir.

Las imágenes de las películas exhibidas y de los proyectos educativos presentados, nos sitúan frente a diferentes modos de encuentro con el cine en situaciones formativas, señalando la pertinencia del plural: CINES y EDUCACIONES, para aquello que emerge como prácticas y experiencias, como imágenes y sonidos, como montajes y políticas.

Contagiados por estas fuerzas, los encuentros KINO de esta edición –integrados por personas y películas indígenas, brasileñas, argentinas, peruanas y bolivianas– nos permitieron reconocer el poder de la red para conectar nuestros trabajos y nuestras luchas, además de proponer una coordinación latinoamericana y un programa de acción de la Red KINO, sintetizado en los siguientes puntos:

  • Mapear obras audiovisuales y difundir una Colección Audiovisual Escolar Libre, creando trayectos pedagógicos que permitan que el cine realizado en América Latina – en sus diversas matrices, contextos, lenguas y formas de expresión – pueda ser compartido en todos los espacios/tiempos educativos, subtitulado y doblado para favorecer la accesibilidad a través de diversas tecnologías de asistencia.
  • Colaborar con la transformación del imaginario colonial históricamente establecido y dar paso a la diversidad pluricultural constitutiva de nuestros pueblos, a través de la difusión de sus películas en escuelas y universidades. Filmes que expresan alternativas al proyecto capitalista global y se convierten en documentos fundamentales para la preservación y transmisión de la memoria de nuestros pueblos.
  • Fortalecer la producción académica en el campo de la educación, el cine y el audiovisual, demostrando la singularidad del pensamiento latinoamericano y construyendo nuevas articulaciones entre educadores de diferentes niveles educativos, con el fin de forjar nuevos horizontes teóricos, conceptuales y otras epistemologías.
  • Construir Grupos de Trabajo para retomar, institucionalmente, la discusión de políticas públicas de educación/cine y audiovisual, como la reglamentación de la Ley 13.006/14 en Brasil, así como la regionalización de los Programas de cooperación a nivel municipal, estatal y federal.
  • Ampliar la circulación de proyectos vinculados a la Red Kino y de sus integrantes, permitiendo el intercambio entre universidades, grupos de investigación y escuelas de metodologías, conocimientos, imágenes y sonidos, mostrando la amplitud de la red y de las acciones ya existentes.
  • Expandir el accionar de la Red Kino articulando Festivales y Programas de cine y educación desde la perspectiva de un pensamiento menos demarcado por las fronteras modernas definidas por los Estados-Nación y más orientado por alianzas – culturales, políticas, institucionales, etc. – construidas a partir de la propia capilaridad de la Red.

Así, reafirmamos que el afecto de la amistad, como sustento inicial de la Red, se convierte en savia que se expande y fructifica en el rizoma que es Kino.

XIV Foro de la Red KINO – Red Latinoamericana de Educación Cinematográfica y Audiovisual

CARTA DE OURO PRETO 2019

“Precisamos descolonizar não apenas os pensamentos e os corpos, mas precisamos descolonizar o olhar desta cegueira monocular. Não é possível descolonizar o olhar sem trazer outros corpos e narrativas para estar presentes nas telas do cinema. Só assim será possível descolonizar e contar uma outra história, narrada por nós mesmos”.

Célia Xakriabá

Os participantes do XI Fórum da Rede Kino – Rede Latino-Americana de Educação, Cinema e Audiovisual, reunidos na 14ª CineOP – Mostra de Cinema de Ouro Preto, renovam o compromisso com a defesa intransigente da Democracia e dos Direitos Civis Humanos, dos Territórios e das Culturas Nacionais e Regionais, reafirmando a potência das diferenças na diversidade e o papel do cinema, do audiovisual e da educação no combate aos sistemas que sustentam as opressões e as desigualdades.

Considerando que a Rede Kino tem seu fórum anual na CineOP (Minas Gerais), e que a temática da Mostra nessa edição foi sobre Territórios Regionais, Inquietações Históricas, queremos nos referir também à mãe-terra. Neste caso, para denunciar os crimes ambientais causados pela Samarco e Vale, cujas ações visando apenas o mercado, tem desconsiderado riscos e fragilidades e a vulnerabilidade dos moradores desses espaços. Da sua relação vital com as terras como preservação da sua existência, história, memória e cultura. Estes crimes além de constituírem genocídios em massa, também destruíram a fauna e flora locais, afetando profundamente também o ecossistema de ambos locais.

Em um cenário tão adverso como o atual, a 14ª CineOP – Mostra de Cinema de Ouro Preto e os eventos que a compõem, foram sonhos coletivos e corajosos, que exigiram resiliência, empenho e muito trabalho de uma equipe engajada na sua concretização. Consideramos imprescindível destacar nosso agradecimento aos profissionais que tornaram o sonho possível.

Dos pontos da carta de 2018, destacamos que as mesmas pautas permanecem atuais e urgentes e precisam ser reafirmadas. Se em 2018, nos manifestamos contrários ao Estado de Exceção, instituído após o golpe de 2016, hoje nos posicionamos na defesa veemente dos direitos humanos, da educação pública gratuita, laica e de qualidade para todos e todas, reafirmando assim a escola como espaço de resistência. Reiteramos a denúncia aos frequentes ataques à cultura e à educação, identificados na extinção do Ministério da Cultura e nos cortes dos orçamentos das instituições federais de ensino, o que inviabiliza programas de pesquisa, ensino e extensão, indispensáveis na garantia de uma educação de qualidade.

Por conta da ausência do poder público, a Rede Kino reitera o seu objetivo de contribuir para fortalecer a formação de professores e professoras na América Latina, facilitando o acesso a projetos de cinema, audiovisual e educação, em contexto formal e não formal, além de organizar um acervo licenciado disponível no site da rede, retomando o desejo de constituição de um Acervo Audiovisual Escolar Livre (AAEL) por meio de mobilização e contribuição de pesquisadores, produtores e realizadores na/da educação, do cinema e do audiovisual como uma forte estratégia de ocupar e resistir.

Afirmamos, enquanto rede, o compromisso de promover eventos e encontros de discussão, de formação e abordagem dos projetos com reverberação regional, nacional e internacional, sempre contando com a participação das pessoas que já se encontram atuantes nesse grupo e ampliando o convite para novas adesões em todos os países da América Latina.

Também propomos fortalecer a comunicação entre diferentes representantes da rede, fazendo uso e atualização do site e redes sociais já existentes. Além de buscar a regionalização da Rede Kino, conectando projetos de cinema e educação e promover eventos e encontros regionais na tentativa de manter uma coordenação horizontal, diversa e democrática.

Manifestamos ainda o interesse da Rede Kino em ampliar as relações latino-americanas, promovendo aproximações às produções e projetos dos países que nos fazem fronteira. Destacamos a presença permanente de convidados internacionais desde o primeiro fórum da Rede Kino em 2009, a saber, México, Argentina, Chile, Cuba, Equador e Uruguai, cujas presenças continuam nos acompanhando trazendo suas instituições e experiências para o encontro.

Diante do tema específico de 2019, que promovia a discussão sobre mulheres, terras e movimentos, discutiu-se a visibilidade e invisibilidade da mulher na produção audiovisual e cinematográfica, em diferentes formas de existir, seja como mulher negra, indígena, quilombola, marginalizada, silenciada ou violentada. Os diferentes projetos apresentaram diversas e ricas abordagens de como a existência da mulher pode ser discutida, documentada, filmada, desconstruída e reconstruída, em outras palavras, produzida. Percebemos a necessidade de fortalecer este debate e que não há como fazê-lo, sem discutir as questões de gênero, feminismo, territórios, fronteiras, ancestralidade, espiritualidade, comunidade, tão presentes na diversidade entre povos e etnias do nosso país. Por causa disso, foi definida, portanto, a criação de um fórum permanente para discutir essa questão.

Com vontade de fazer acontecer, estas são nossas proposições para o próximo ano. Continuamos com o desejo de que a rede permaneça com esta laboriosa trajetória de construção coletiva e que possamos unir forças para enaltecer as potências que unem o cinema, audiovisual e educação, como gesto de resistência a todas as catástrofes que nos ameaçam.

Ouro Preto, 10 de junho de 2019.

Rede Kino – Rede Latino Americana de Educação, Cinema e Audiovisual

CARTA DE OURO PRETO 2017

Os participantes do IX Fórum da Rede Kino – Rede Latino-Americana de Educação, Cinema e Audiovisual, reunidos na 12ª CineOP – Mostra de Cinema de Ouro Preto, reafirmam a defesa da democracia e dos direitos civis humanos, das culturas nacionais e regionais e o compromisso com a democratização do audiovisual no Brasil e na América Latina.

Se antes vislumbrávamos algum respaldo de políticas públicas, hoje enfrentamos um cenário inóspito em que a Lei 13.006, sobre a qual nos debruçamos nas últimas edições, é um ponto de diálogo e referência para a continuidade dos trabalhos de cinema e educação e a cinematografia nacional. Com a atual crise política, este ano não temos um espaço de diálogo no nível governamental nos Ministérios da Educação e da Cultura. Diante desse cenário, vimos a necessidade de fortalecer e ampliar o debate com os interlocutores da própria rede, mobilizando também novos agentes, universidades, escolas, projetos formais e não-formais, secretarias de educação municipais e estaduais para a continuidade do trabalho e da pesquisa com cinema e educação em diferentes esferas.

Neste ano, a abordagem temática da educação no IX Fórum da Rede Kino – 12a CineOP foram as Emergências Ameríndias. Diante do desmonte do Estado e do perverso jogo de poderes institucionalizado nas esferas políticas e do capital, a sobrevivência dos povos originários torna-se a ponta ainda mais frágil. Desconsidera-se a existência de 305 etnias, 274 línguas e uma população de cerca de 900 mil indígenas pelo interesse latifundiário e do agronegócio. O genocídio, o etnocídio, o preconceito e o ataque constante que sofrem demandam que as questões indígenas entrem em nossa agenda política, cultural e educativa com urgência.

Tendo em vista que grande parte da população só enxerga o indígena a partir de imagens que dele são produzidas – em geral imagens estereotipadas, etnocêntricas e criminalizadoras -, destacamos a magnitude que essas imagens possuem e a necessidade de produções simbólicas mais adequadas às suas cosmovisões e modos de vida.

Nesse sentido, os filmes produzidos por, sobre e com os indígenas são uma forma de luta, ocupação estética e descolonização do olhar e necessitam estar presentes nas espaços de formação para desestabilizar a nossa percepção de mundo. Reafirmamos o quanto esses filmes, inseridos em contexto educativo, podem provocar o reconhecimento dos povos indígenas, por essa razão encaminhamos propostas que considerem a relevâncias dessa produção fílmica. A partir destes encontros com diferentes experiências estéticas e dos diálogos estabelecidos durante o IX Fórum da Rede Kino, os participantes defendem:

– Uma educação intercultural e um Estado Multinacional, que reconheça os saberes tradicionais dos povos originários, com respeito aos modos de vida e à diversidade das etnias indígenas;

– A educação pública, em oposição a PEC 55 e o congelamento dos investimentos públicos por 20 anos e às apropriações das grandes corporações empresariais que capturam as subjetividades e doméstica sensibilidades em prol de um mercado eficaz, a mesma eficácia que serve como argumento para exterminar os indígenas.

– A necessidade de integralizar a produção indígenas às ações da Rede Kino partindo do fato evidente de que cinema indígena deve ser reconhecido como cinema brasileiro e, portanto, ser difundido em escolas, cineclubes e espaços de formação audiovisual com o propósito de descolonizar o nosso olhar e escuta.

– Destacamos as produções do Projeto Vídeo nas Aldeias, que há trinta anos tem um intenso compromisso com a formação audiovisual de diversas etnias do Brasil e cuja produção fílmica já está disponível em grande parte na internet.

– Da mesma forma, defendemos os demais bens públicos culturais, como a Empresa Brasileira de Comunicação, que vem sendo destituída pelo governo em exercício, tal como os editais e políticas públicas para o audiovisual que vinham contribuindo para regionalização e pluralização das imagens do Brasil.

– Fomentar o trabalho em rede como ação de fortalecimento e ampliação das atividades da Rede Kino em suas relações regionais, latino-americanas e também na conexão com outros países de língua portuguesa.

– Questionamos como a Base Nacional Curricular (BNCC) comum traz o cinema apenas tangencialmente, diante da sanção da lei 13.0006/14 e sugerimos enfaticamente sua inclusão como componente curricular ou como subcomponente curricular das Artes Visuais. O cinema e o audiovisual são transdisciplinares no desenvolvimento de habilidades e competências específicas a serem experimentadas como conteúdo na grade oficial e-ou diversificada dos currículos escolares.

– No que concerne à regulamentação e implantação da Lei 13.006/14, a Rede Kino solicitará ao Conselho Nacional de Educação que dê atenção e fomente o diálogo com as questões apresentadas no documento produzido pelo Grupo de Trabalho de Cinema Escola que já lhe foi encaminhado em 04/05/2016 e com o acordo de cooperação MinC/MEC.

Precisamos esclarecer que as diversas iniciativas de democratização do audiovisual já estão em curso pelo país independente da criação da Lei, por isso, contamos com o comprometimento das instâncias governamentais no sentido de considerar os trabalhos, as pesquisas e as articulações já existentes. A regulamentação e a efetivação da agenda consagrada na lei 13.006 representa um passo decisivo para transformarmos palavras em políticas públicas. Isso é ainda mais sensível de se dizer em um contexto de sérias ameaças das políticas educacionais do país, seja pela austeridade dos orçamentos seja pelo tolhimento da autonomia e da criatividade para propor uma educação crítica e emancipada e emancipatória.

Ressaltamos o quanto os filmes, as discussões e os encontros durante esta edição do Fórum favorecem um espaço fecundo criando condições para a emergência da produção audiovisual, da sua memória em diferentes contextos e épocas com foco especial na questão indígena. A temática ameríndia traz uma urgência que nos desestabiliza e traduz um certo desmoronamento que atenta para uma sensibilidade que tem sido exaurida. Sabemos que não há transformações que não passem por radicais mudanças sensíveis, por isso o cinema indígena contribui para nos dar fôlego. Este encontro e mostra foram históricos, pela ocupação de imagens dos povos originários, por possibilitar representantes da educação encontrarem com cineastas e artistas indígenas como Para Yxapy, Isael e Suely Maxacali, Arissana Pataxó. Destacamos também a importância do encontro com professores, estudantes, profissionais do audiovisual e todos aqueles que com suas imagens, pensamentos e ações, nos convocam a continuar. Por último, olhar para as questões indígenas não significa voltar-se ao passado apenas, mas é preocupar-se com presente, dado que os modos de vida dos povos indígenas refletem a maior biodiversidade no território nacional. E como salienta o mestre xãmanico Davi Kopenawa, se não houvesse mais nenhum deles vivo para sustentar o céu, ele já teria desabado.

Ouro Preto, 26 de junho de 2017.

Rede Kino – Rede Latino Americana de Educação, Cinema e Audiovisual

CARTA DE OURO PRETO 2016

CARTA DE OURO PRETO 2016

Os participantes do VIII Fórum da Rede Kino (Rede Latino-Americana de Educação, Cinema e Audiovisual), reunidos na 11a. CINEOP (Mostra de Cinema de Ouro Preto), reafirmam seu compromisso com a Democracia e o Estado de Direito, com a defesa da cultura nacional e regional e com a democratização do audiovisual no Brasil e na América Latina.

No que concerne à regulamentação e implantação da Lei 13.006/14, a Rede Kino reafirma seu compromisso com o documento produzido pelo Grupo de Trabalho de Cinema Escola encaminhado ao Conselho Nacional de Educação, em 04/05/2016 e com o acordo de cooperação MinC/MEC. Nesse sentido, reiteramos alguns princípios da proposta do Subgrupo de Formação Docente e acrescemos alguns de nossos posicionamentos diante do que está sendo proposto:

– Acedemos com a proposição de que a perspectiva do trabalho com o cinema e com o audiovisual na escola se configura como experiência estética portadora de conhecimentos próprios;

– Reiteramos que o encontro com o cinema na escola, ampliado pela lei 13006/2014, deve mobilizar toda a comunidade escolar, professores, coordenadores, funcionários e estudantes, bairros e comunidades, por meio do planejamento pedagógico da escola;

– Dada à natureza formativa da experiência com o cinema e o audiovisual na escola, reafirmamos a necessidade de que esta se realize prioritariamente com os professores, devendo realizar-se como atividade dignamente remunerada incluída na sua jornada de trabalho;

 – A implementação da lei 13006/14 exige o estabelecimento universal das condições mínimas e desejáveis para o trabalho com o cinema brasileiro nas escolas de todo o país, levando em conta os locais e os equipamentos de projeção, produção e armazenamento, através de mídias físicas e de redes de compartilhamento;

– Visto que os espaços escolares são lugares de cinema e de audiovisual de alteridade e diversidade, é necessário que o acervo a ser disponibilizado a todas as escolas do país, contemple a diversidade étnico-racial, geográfica, cultural, social, sexual, de gênero, rural, socioambientais, afro-brasileiras, indígenas, quilombolas, religiosas, de populações itinerantes, de povos e comunidades tradicionais, de comunidades de cegos, surdos, gênero e sexualidade, da infância e da juventude considerando todas as diretrizes do PNDH, PLANO NACIONAL DE DIREITOS HUMANOS, entre outras, contendo produções independentes, coletivas, financiadas ou não pelo Estado;

– Faz-se necessário que o cinema e o audiovisual se configurem junto com os demais campos das artes como componente curricular obrigatório e disciplinar, exigindo, assim, a ampliação das horas semanais de artes na escola. Considera-se também que, na parte diversificada do currículo, se garantam a presença e qualificação do audiovisual e do cinema.

Acreditamos que, para o efetivo alcance de nossas proposições, enfatizamos a defesa da Empresa Brasileira de Comunicação – EBC e do projeto Brasil 4D na TV pública interativa voltada para as famílias de baixa renda, contra a política intervencionista de um governo federal provisório e ilegítimo.

No tocante à proposta de “Escola Sem Partido”, outro modo de dizer “Uma Escola com Mordaça”, manifestamos nosso repúdio frente a esse movimento de cerceamento da liberdade de expressão e da autonomia dos professores, estudantes e demais agentes escolares na definição e realização de seus projetos pedagógicos e curriculares. Defendemos uma escola plural, pública, laica, democrática, que respeite a diversidade étnico-racial, religiosa, política e de gênero, entre outras, e a livre manifestação do pensamento e da expressão. O cinema na escola se vê ameaçado e seguramente criminalizado diante desse movimento.

Manifestamos o nosso apoio ao movimento ético, estético e político das ocupações das escolas públicas realizadas pelos estudantes de todo o país, nos diferentes níveis de ensino, por considerarmos essas ações coletivas justas, democráticas e pedagógicas, uma vez que seus propósitos reiteram o direito à educação de qualidade, de qualidade social.  Reconhecemos essas ocupações como manifestações legítimas e necessárias, revelando a potência da comunidade escolar para pensar e criar outras possibilidades para a escola.

Ouro Preto, 26 de junho de 2016

Rede Kino – Rede Latino-Americana de Educação, Cinema e Audiovisual

Carta de Ouro Preto – 2024

A Mostra de Cinema de Ouro Preto e a Rede Kino – Rede Latino-Americana de Educação, Cinema e Audiovisual promoveram uma ampla consulta pública remota, prévia ao encontro presencial, para atualizar e ampliar a proposta de regulamentação da Lei Federal 13.006/14, que determina a exibição de duas horas de cinema brasileiro por mês nas escolas da educação básica. Foi elaborado um formulário que foi respondido por uma comunidade formada por educadores, gestores públicos, cineastas, profissionais da preservação, pesquisadores, professores e interessados na implementação de uma política pública que garanta a implementação da Lei. A partir das respostas recebidas, foram criados quatro Grupos de Trabalho (GTs) presenciais durante a 19ª CineOP. Contando com a participação de profissionais da cultura, da educação e representantes do Ministério da Cultura (MINC), representantes do Ministério da Educação (MEC) e Ministérios dos Direitos Humanos (MDH), os Grupos de Trabalho elaboraram um documento com uma proposta que visa contribuir com parâmetros e diretrizes para a construção de um Programa Nacional de Cinema na Escola.

A discussão pública do Programa foi dividida, portanto, em duas etapas. Na primeira etapa, realizada previamente, houve a ação online com a consulta para atualizar e ampliar a proposta de regulamentação da Lei 13.006/14. As questões do formulário visaram construir coletivamente um documento que apontasse os elementos necessários para as práticas cinematográficas nos contextos escolares, respeitando a diversidade dos territórios e valorizando a circulação das culturas e dos filmes que compõem o país. A Segunda etapa idealizada foi a ação presencial com a instituição dos quatro Grupos de Trabalho (GTs), constituídos em torno dos seguintes temas: Formação docente; Condições de produção e exibição; Acervos e curadorias; e Pedagogias.

Por meio de um edital próprio, o público da Mostra pôde se inscrever para tomar assento nos quatro GTs. Além dos GTs, foram inseridos na programação do evento debates abertos ao público. As reuniões dos GTs aconteceram nos dias 19 e 20 de junho, em Ouro Preto.

Sobre a metodologia adotada pelos GTs, no dia 19 de junho, primeiro dia de trabalho, os GTs se encontraram no auditório do Encontro da Educação para uma apresentação inicial sobre a dinâmica de trabalho e, na sequência, cada GT se reuniu separadamente para sistematizar as principais questões resultantes do levantamento da ampla consulta pública que orientou o debate nesse primeiro momento. Já no dia 20 de junho, segundo dia de trabalho, as sessões foram iniciadas com a apresentação das principais questões resultantes da sistematização dos debates do dia anterior. Foi feito um novo debate com adensamento das questões apresentadas no primeiro dia e elaboração de pontos que sintetizam a discussão. Abaixo apresentamos os resultados resumidos das contribuições e debates que serão sistematizados para o documento final da proposta para um Programa Nacional de Cinema na Escola a ser endereçada ao Ministério da Cultura, ao Ministério da Educação, Ministério de Direitos Humanos, Secretaria de Comunicação e demais representantes do governo implicados no assunto.

Para que a elaboração do Programa Nacional de Cinema na Escola se torne efetiva, chamamos atenção para as seguintes Diretrizes e Objetivos Estratégicos resultantes do processo coletivo acima descrito:

  1. Articulação do Programa Nacional do Cinema na Escola às Políticas Educacionais e Audiovisuais do Brasil

Promover políticas de formação, produção, distribuição/circulação, exibição e preservação audiovisual que dialoguem com as políticas da educação, cinema e audiovisual e garantam o acesso e a acessibilidade do cinema brasileiro independente nas escolas. Contribuir de forma maciça com as principais políticas do MEC para Educação Básica, a saber: Compromisso Nacional Criança Alfabetizada; Programa Escola em Tempo Integral; Estratégia Nacional de Escolas Conectadas; ampliação das vagas em creches, pré-escola e novos estabelecimentos de educação infantil, por meio do Educação Infantil Manutenção (EI Manutenção); criação de

grupos de trabalho interfederativos para debater os anos finais do ensino fundamental e a recomposição da aprendizagem; e envio ao Congresso Nacional do Projeto de Lei n. 5.230/2023 sobre a Política Nacional do Ensino Médio, assim como o diálogo com as diretrizes, objetivos estratégicos e programas do Plano Nacional de Cultura, das políticas do Cinema e Audiovisual brasileiro e seus respectivos responsáveis, como a Secretaria do Audiovisual do MinC, a ANCINE e o Conselho Superior de Cinema.

  1. Democratização de Práticas Pedagógicas com Cinema

Incentivar práticas pedagógicas diversificadas com o cinema para proteger e promover a diversidade cultural de todos os grupos étnico-raciais e suas derivações sociais, reconhecendo a abrangência das noções de educação, escola, cinema e audiovisual, em todo o território nacional, envolvendo professores, estudantes e toda a comunidade escolar, para garantir a multiplicidade de valores, formações e colaborar com a consolidação da democracia brasileira.

  1. Integração e Transversalização do Cinema às Políticas Educacionais

Incorporar o cinema aos currículos e projetos político-pedagógicos, preservando a autonomia das unidades escolares e processos educativos. Reconhecer o cinema em seus múltiplos modos, como comunicação, linguagem, arte e cultura, e transversalizar sua presença nos documentos oficiais de educação, articulando-o aos demais componentes curriculares de forma inter e transdisciplinar.

  1. Acesso Universal e Acessibilidade Integral

Assegurar as condições integrais para a produção e difusão acessível do cinema brasileiro e latinoamericano nas escolas, garantindo a conectividade e o acesso a obras, materiais e tecnologias audiovisuais com recursos assistivos, proporcionando a inclusão de todos os

estudantes no universo cinematográfico e garantindo o direito universal à educação de qualidade.

  1. Inserção na Escola em Tempo Integral

Garantir a implementação de práticas pedagógicas com o cinema nas escolas de tempo integral, oferecendo experiências diversificadas para os estudantes, assistência técnica, formação e condições de trabalho adequadas para os profissionais da educação.

  1. Articulação das políticas do Cinema, Audiovisual e Educação à Cultura Digital

Defender e priorizar a adoção de tecnologias não proprietárias visando à soberania digital brasileira e integrar as metodologias e pedagogias do cinema, audiovisual e educação ao Plano Nacional de Educação Digital e à Estratégia Nacional Escolas Conectadas, com vistas a estabelecer uma relação ética com as tecnologias digitais,como a realidade virtual e a inteligência artificial.

  1. Fomento a Redes de Plataformas Regionalizadas e Participação nos Acervos Nacionais

Fomentar redes regionais e plataformas de cinema e educação com equipes multidisciplinares, focadas na promoção e difusão de práticas educativas territorializadas com o cinema nas escolas e na formação docente, bem como garantir a participação da produção audiovisual escolar nos acervos públicos, repositórios e plataformas oficiais brasileiras.

  1. Desenvolvimento de Processos Colaborativos

Implementar ações de produção e difusão do cinema na escola por meio da constituição de processos colaborativos e a articulação de saberes interdisciplinares e transdisciplinares, integrando gestores culturais e escolares, docentes, estudantes, curadores, artistas,

pesquisadores, profissionais de saúde mental, agentes comunitários para construir pontes entre as escolas e ambientes de cinema, cultura e arte, como festivais e mostras, salas públicas de exibição, cinematecas e cineclubes e os variados equipamentos que compõem o ecossistema de cultura e arte no país em compromisso com a dimensão ética, estética e política da educação.

  1. Formação Docente com Experiências Cinematográficas

Garantir que a formação inicial e continuada dos docentes inclua experiências diversificadas com cinema, desde cineclubes até disciplinas obrigatórias sobre cinema e educação, bem como incentivo à criação de cursos de licenciatura em cinema, em consonância com as possibilidades e condições dos contextos e das instituições formativas.

  1. Produção de Tecnologias Locais e Sustentáveis

Estimular a produção de tecnologias locais empregando materiais sustentáveis com menor impacto ecológico, desenvolvendo soluções latino-americanas inclusivas e adaptadas às especificidades locais.

Ao longo do evento, que contemplou ainda cinco mesas de projetos audiovisuais educativos realizados em diversos estados brasileiros e em países da América Latina e Europa, duas sessões de filmes feitos em escolas, duas Masterclass internacionais, ficou evidenciado que a experiência do cinema nas escolas representa hoje, mais do que nunca, uma maneira de garantir a imaginação de novos mundos em comum, a escuta sensível, o respeito à diferença e uma ação de cuidado e questão de saúde pública. Essas potencialidades do cinema foram identificadas como uma saída para a defesa de uma sociedade democrática em que exista espaço para as produções subjetivas individuais e das grupalidades que residem nas escolas. A partir de uma série de exemplos que foram exemplificados na descrição de práticas de projetos de abordagens distintas foi detectada a urgência da garantia de experiências formativas com o cinema para que, por meio do acesso à educação e ao cinema, as crianças, os jovens e seus professores possam resistir contra discursos que promovem o ódio, o extermínio da diferença e a dissolução da experiência da presença.

Fica registrada ainda a solidariedade da Rede aos colegas da Argentina que enfrentam neste momento histórico o combate a um governo de extrema direita que impõe a perseguição à educação e à cultura, esgarçando a vida democrática e o pacto civilizatório que deveria sustentar a dignidade das pessoas e da vida em sociedade. Acreditamos que só o investimento em uma educação de qualidade social possa nos fazer trilhar outros caminhos que estejam direcionados para o bem viver. Sabemos que o cinema é hoje um importante aliado nesse sentido e, por isso, convocamos representantes do governo a trabalharem juntos em prol de uma política pública de estado para o campo do cinema e da educação.


Ouro Preto, 24 de junho de 2024.

Rede Latino-Americana de Educação, Cinema e Audiovisual

Proposta de Regulamentação da Lei 13.006/2014

A CINEOP – Mostra de Cinema de Ouro Preto e a Rede KINO – Rede Latino-Americana de  Educação, Cinema e Audiovisual convidam você para participar da Ampla Consulta Remota para atualizar e ampliar a proposta de regulamentação da Lei 13.006/14 com vistas a elaboração de uma proposta de Plano Nacional de Cinema na Escola. A ideia é construir coletivamente um documento que aponte perspectivas, diretrizes e formas de inserção das práticas cinematográficas nos contextos escolares, respeitando a diversidade dos territórios e valorizando a circulação das culturas e dos filmes que compõem o país.

A Lei Federal 13.006, que determina a exibição de, no mínimo, duas horas de cinema brasileiro por mês nas escolas da educação básica, como carga curricular complementar, foi promulgada em 2014. À época, foi criado um grupo de trabalho com o objetivo de subsidiar a implementação da lei, elaborando metas a curto, médio e longo prazo para sua efetiva aplicação. O grupo foi composto por representantes da sociedade civil, membros do Ministério da Cultura e do Ministério da Educação.

Em maio de 2016, com o trabalho realizado coletivamente, o grupo entregou a Proposta de Regulamentação da Lei 13.006 ao Conselho Nacional de Educação. Após a leitura e debate, o Conselho indicou que o documento servisse como base para o desenvolvimento de um Plano Nacional de Cinema na Escola. O trabalho não avançou nos anos seguintes devido à mudança de rumos da política e à extinção do MinC.

Acreditamos que, no momento atual, com a criação da Política Nacional da Educação Digital (Lei Federal 14.533/23) e a proposição da Estratégia Nacional Escolas Conectadas, em setembro de 2023, faz-se urgente a retomada da proposta do Plano Nacional de Cinema na Escola. Entendemos que a ação tem potencial para resgatar o debate construído em rede e colaborar com as demandas formativas e curriculares voltadas para uma educação diversa e inclusiva, ancorada também nas Leis 10.639/03 e 11.645/08, que preveem a presença de imagens das culturas indígenas e afro-brasileiras nos currículos de ensino fundamental e médio do país.

Assim, esta consulta pública em duas etapas visa à construção coletiva de uma proposta para o Plano Nacional de Cinema na Escola. O intuito é recolher as colaborações de forma remota para subsidiar a realização dos debates presenciais que ocorrerão durante a 19ª CineOP, que acontece de 19 a 24 de junho de 2024, em Ouro Preto. Esta iniciativa se propõe a conceber, formalizar e entregar um documento ao poder público, a fim de colaborar com a formulação e implementação de políticas públicas de formação e acesso ao cinema nos contextos escolares.

Agradecemos muito a sua participação e o tempo dedicado a ler, refletir e contribuir para pensar a proposta do Plano Nacional de Cinema na Escola, que incorpore e fortaleça a implementação da Política Nacional de Educação Digital.

*Para participar desta consulta pública, é imprescindível que leia atentamente a proposta de regulamentação da lei 13006/14 disponível neste link: Proposta de Regulamentação da lei 13005/14

Então, antes de começar a responder este formulário, faça o download e leia na íntegra o documento

**Para acessar documentos de referência e consulta (opcional) acesse este link: documentos de referência.

I MOSTRA KINO CAMPINAS

banner-kino

A I MOSTRA KINO CAMPINAS é uma iniciativa para fomentar o debate do cinema na escola e em outros espaços educativos.

O cinema que, em sua heterogênese, coloca o pensamento em arte, linguagem e tecnologia. Corpo e tempo e corpo e espaço, percepção e memória. Cinema que ensina desejar e querer, que transversa consciência, conhecimento, saberes e criação.

MOSTRA para conversar com a prática da câmera e com as ideias nas escolas públicas e privadas, nas ações educativas formais e não-formais; na educação infantil, no ensino fundamental e médio (Educação Básica). Proposta que parte de provocações para criação com o cinema nacional.

Uma MOSTRA (não competitiva) para pensar e contribuir com a Lei 13006/2014 que torna obrigatória a exibição de 2 horas de filmes de produção nacional nas escolas. Uma MOSTRA para conversar sobre a Base Nacional Comum Curricular (BNC).

Escolha um dos princípios de criação do Regulamento da I MOSTRA KINO CAMPINAS, realize seu filme e inscreva-se para podermos pensar a potência do cinema na educação.

Comissão Organizadora

Link: I MOSTRA KINO CAMPINAS

Carta de Ouro Preto 2015

Nós, integrantes da Rede Latino-Americana de Educação, Cinema e Audiovisual – Rede KINO, presentes na 10ª Mostra de Cinema de Ouro Preto – CineOP, de 18 a 23 de junho de 2015, reunidos no VII Fórum da Temática Educação, nos dirigimos aos órgãos públicos, instituições e autoridades representantes da sociedade civil, responsáveis pela criação, implementação e fortalecimento das políticas públicas da educação e do cinema brasileiro.

Na carta produzida no final do encontro do ano passado, explicitamos alguns pontos que nos pareciam fundamentais e os dirigimos às instituições responsáveis com a expectativa de que tais colocações pudessem reverberar em algumas iniciativas. Entretanto, a tramitação do Projeto de Lei 13.006 proposto pelo senador Cristovam Buarque, e sua consecutiva sanção pela presidenta Dilma Rousseff, exigiu de nós uma imediata articulação. A nova lei, a saber, ainda a ser regulamentada, obriga a exibição de 2h mensais de cinema brasileiro em todas as escolas da educação básica do Brasil. Em todas, entendemos, segundo censo escolar de 2013 (Ideb), um contingente que ultrapassa 190.000 escolas nas cinco regiões. Destas, cerca de 33% não possuem sequer televisão e embora a internet atinja quase 60% das escolas, apenas 48% dispõem de banda larga, infra-estrutura básica para a exibição de filmes. Um número bastante expressivo de escolas, portanto, está imediatamente à margem do que propõe a Lei 13.006.

Assim, entendemos a necessidade de que no Fórum deste ano nos dedicássemos com bastante atenção ao que diz a Lei. E, ainda mais, quais são algumas das ações práticas possíveis para que sua aplicação não seja mais uma das tantas propostas que recaem arbitrariamente sobre toda a comunidade escolar, de maneira vertical. Ao mesmo tempo, existe um longo caminho percorrido não apenas pela Rede KINO, mas por todos aqueles que vem se dedicando às pesquisas de cinema e educação no Brasil e na América-Latina. Caminho este que deve ser novamente enunciado ao governo e às autoridades responsáveis pela regulamentação da Lei, no sentido de que sejam ouvidas atentamente as demandas daqueles que também ocupam as salas de aula, as coordenações pedagógicas, as universidades, as direções escolares e também os cineastas, cineclubistas, produtores e agentes do setor.

Entendemos que a aplicação da Lei e a presença do cinema na escola não deve atender à exigências e modos de produção que deem continuidade às práticas impostas pelo mercado. Não se trata, portanto, de uma política de formação de plateias, como vem sugerindo alguns dos importantes representantes dessa indústria cinematográfica. Práticas de alteridade, formas de perceber e inventar o mundo e a si mesmo, conhecimento que se produz com a experiência, o cinema na escola é uma ação essencialmente política. De uma política fortemente marcada por princípios educacionais e o reconhecimento de uma educação compartilhada que compreende o processo e não apenas seus resultados, que estimula a autonomia e o protagonismo dos estudantes e oferece mais elementos e ferramentas para que os professores possam potencializar suas práticas de ensino.

Reivindicamos a circulação de um vasto universo de outras imagens realizadas no país, que refletem também nossa diversidade étnica, geográfica, cultural, social, e não representam a força hegemônica e centralizadora dos grandes conglomerados midiáticos e as agências de comunicação. Produções independentes, amadoras, coletivas, financiadas ou não pelo Estado, que certamente revelam as contradições e contrastes do nosso povo, reconhecendo nossas diferenças.

Aqui, retomamos alguns dos pontos da carta de 2014 e exigimos dos órgãos governamentais, que representantes da Rede KINO e seus membros constituam as mesas e grupos de trabalho de debate para a regulamentação da Lei 13.006. Tal exigência se justifica considerando o acúmulo de mais de quatro décadas de experiência na reflexão e invenção no campo do cinema e da educação por meio da participação ativa de membros representantes de universidades, escolas, cineclubes, produtoras, ONG’s, órgãos públicos de todo o Brasil.

Defendemos então, para a aplicação da Lei, mecanismos e soluções que não financiem a iniciativa privada do setores de produção, distribuição e exibição de filmes e audiovisuais. Sugerimos formas colaborativas de organizar o que já existe; de tornar visível o que já é público; de enunciar os direitos de todos ao acesso desses filmes já produzidos; de garantir a integridade dos espaços já existentes para que os encontros entre o cinema e a educação sejam frutíferos. E, sobretudo, formas abertas e múltiplas de autonomia para os professores e toda a comunidade escolar, garantindo que a inclusão do cinema brasileiro nas escolas seja orgânica e responsável, atenta ao caráter ético, estético e político do cinema e da educação brasileira.

Assim, destacamos:

1) Acervo Audiovisual Escolar Livre;

Sabemos que há décadas os filmes no Brasil vêm sendo produzidos com recursos públicos. Exigimos que todo e qualquer filme feito com parcial ou total fonte de recursos da União, dos Estados e dos Municípios, seja devolvido às escolas após seu período de exploração comercial. Não há justificativa para o paradoxo de que, agora, com a exigência da Lei 13.006, sejam comprados pacotes de filmes com dinheiro público. Duplo investimento do Estado ao pagar por aquilo que já está quitado. Dada a obrigação de exibir filmes na escola, torna-se obrigação também das agências reguladoras inserir em seus editais e leis de incentivo contrapartidas em números de cópias físicas e arquivos digitais para composição do acervo escolar, sem fins lucrativos.

Com relação ao conteúdo deste acervo, defendemos que sejam privilegiados filmes que garantam a diversidade geográfica e memoria histórica do país, com critérios mais culturais que comerciais, considerando que a circulação destes últimos já está assegurada pelo mercado. Nesse sentido, torna-se necessária a preservação do patrimônio audiovisual brasileiro.

2) Chamada Pública para Disponibilização Gratuita de Acervos Públicos e Privados por Realizadores, Artistas Visuais, Produtoras, Acervos Públicos e Privados, Cinematecas e demais órgãos;

A sugestão pela criação de um Acervo Audiovisual Escolar de Filmes Livres vem acompanhada da proposta de publicação de uma chamada pública voltada a realizadores, produtoras, acervos públicos e privados, televisões públicas, cinematecas, entre outros. Existem inúmeros filmes que já podem ser incorporados por esse acervo livre. Não se trata de fomentar a produção, ela já existe em diversas janelas e formas de acesso. Algumas, inclusive, de maneira ilícita, o que comprova a necessidade de revisão da Lei dos Direitos Autorais quando se trata da difusão de bens simbólicos para fins educativos.

Em pouco tempo, acreditamos que este acervo possa se tornar uma enorme ferramenta educativa, com milhares de filmes, algo jamais produzido para tamanha escala e com tal volume. Insistimos que não é uma demanda pela criação de um edital que ofereça contrapartidas àqueles que detêm os direitos de exploração dos filmes, mas uma chamada que se dirija aos que compreendem que esta é uma forma de retroalimentar simbolicamente o investimento público ao audiovisual brasileiro e que esses filmes também devam compor o imaginário da vida escolar, como os livros e demais recursos pedagógicos.

Isso nos leva a discutir a própria noção do que é cinema, entendido aqui como uma forma expandida que excede a concepção fomentada pelo mercado e as salas multiplex. Possuímos uma quantidade inestimável de imagens que pode ser muito bem incorporada pelos professores e explorada em suas especificidades estéticas, temáticas, discursivas, absorvendo filmes provenientes das mais diversas regiões do Brasil.

3) Plataforma digital de exibição;

Acreditando no compromisso firmado pelo Estado quanto à implementação da Banda Larga em todas as escolas do Brasil, proposta para 2014, sugerimos a criação de uma plataforma virtual para exibição e download dos filmes, sem fins comerciais.

Afirmamos a necessidade de garantir o acesso aos filmes de forma virtual, ação esta que pode minimizar amplamente a produção de cópias físicas, reduzindo o montante dos recursos dispensados para a criação do Acervo.

4) Catálogo de filmes em DVD;

Para o contingente de escolas que não possui internet ou banda larga, inviabilizando assim o acesso à plataforma digital, recomendamos o fornecimento de cópias físicas em suporte DVD. Apesar de obsoleto e de extrema fragilidade, o DVD ainda é para muitas das escolas o principal modo de acesso aos filmes.
As escolas devem ter completo e irrestrito poder na seleção e curadoria dos filmes, a partir do Acervo Audiovisual Escolar Livre, ainda que seja necessário restringir o número de filmes diante do imenso Acervo possível, desde que garantida sua variedade e tempo suficiente para o cumprimento da Lei ao longo do ano letivo.

5) Acessibilidade e recursos assistivos;

Enfatizamos a urgência de se pensar a produção de novos filmes e projetos audiovisuais com a linguagem brasileira de sinais (LIBRAS) e o sistema de audiodescrição, em conformidade com a Instrução Normativa nº 116, de 18 de dezembro de 2004 da ANCINE, a saber:

Art. 1º.Todos os projetos de produção audiovisual financiados com recursos públicos federais geridos pela ANCINE deverão contemplar nos seus orçamentos serviços de legendagem descritiva, audiodescrição e LIBRAS – Língua Brasileira de Sinais.

§ 1º.Entende-se audiodescrição como uma narração, em língua portuguesa, integrada ao som original da obra audiovisual, contendo descrições de sons e elementos visuais e quaisquer informações adicionais que sejam relevantes para possibilitar a melhor compreensão da obra.
§ 2º.Legendagem descritiva corresponde à transcrição, em língua portuguesa, dos diálogos, efeitos sonoros, sons do ambiente e demais informações da obra audiovisual que sejam relevantes para possibilitar a melhor compreensão da obra.
§ 3º.Entende-se como Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS a forma de comunicação e expressão, em que o sistema linguístico de natureza visual-motora, com estrutura gramatical própria, constitui um sistema linguístico de transmissão de ideias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil.

Embora reconheçamos o pequeno número de produções audiovisuais brasileiras comprometidas com a acessibilidade plena para pessoas com deficiência visual e auditiva, é imprescindível a catalogação das obras já existentes com tais recursos imediatamente. Desse modo, apontamos para um horizonte pedagógico capaz de ampliar os processos inclusivos em direção a uma equidade que contemple os direitos cidadãos de todos os brasileiros.

6) Infra-Estrutura;

Pensamos que a presença do cinema na escola implica em garantia de condições essenciais de infraestrutura, tais como:

– existência de espaços adequados à exibição;
– equipamentos de projeção de imagem e som de alta qualidade, fundamentais para a fruição adequada dos filmes e execução plena das tecnologias assistivas;
– climatização dos espaços de exibição, especialmente nos estados afetados por condições climáticas que possam inviabilizar a exibição dos filmes;
– manutenção / estímulo à preservação dos equipamentos e tecnologias permanentes adquiridas.

7) Comunicação e Divulgação;

Fortalecendo a implementação do Plano Nacional de Educação nas suas 20 (vinte) Metas e da Base Nacional Comum da Educação, indicamos que a Lei 13.006/2014 seja objeto de ampla visibilidade, nos mais diversos fóruns nacionais, regionais e locais, bem como pelas Secretarias de Educação, Ministérios, Universidades, Instituições da Sociedade Civil, Sistemas Públicos e Privados de Ensino e Meios de Comunicação, a fim de apresentar, divulgar e problematizar a Lei e sua consecutiva regulamentação.

É necessário também estimular o trânsito entre a escola e os museus de cinema, cinematecas e cineclubes, incorporando a cultura cinematográfica e a influência de seus agentes e a historicidade do cinema

8) Formação de professores;

Partimos do entendimento de que a formação docente não se esgota no âmbito da educação formal, tendo em vista a alta complexidade de todo o processo formativo, notadamente aqueles que tensionam saberes e práticas de diferentes campos do conhecimento. Assim sendo, apontamos a necessidade da consolidação das parcerias já existentes entre Universidades, escolas de Educação Básica e toda uma variada e extensa gama de instituições e iniciativas que compõem este processo formativo, bem como, do estabelecimento de novas redes de formação.

Afirmamos a perspectiva de se trabalhar com obras audiovisuais na escola como experiências estéticas portadoras de conhecimento próprio, em diálogo com diferentes conhecimentos disciplinares. O cinema na escola coloca entre outras questões as visualidades que temos e aquelas que pretendemos construir com a educação escolar.

A REDE KINO, rede que articula universidades, organizações da sociedade civil sem fins lucrativos, cineclubes, escolas entre outras instituições de saberes e práticas em cinema e educação, se compromete a colaborar com os processos de formação a partir de demandas concretas e realidades específicas que definem formatos próprios do trabalho colaborativo.

É preciso também pensar em formas de valorizar e respeitar a organização do trabalho dos professores e considerar a intensificação da atividade docente a partir das novas demandas exigidas para a escola na contemporaneidade. Assim, a Lei 13006 deve ser cumprida dentro da carga horária dos professores.

9) Sistematização de metodologias;

Já há um saber bastante avançado em torno desta temática. Este saber está traduzido em pesquisas acadêmicas, teses, dissertações, artigos, livros, sistematizadas por fóruns, seminários, colóquios, congressos e eventos que vem reunindo gradativamente professores, estudantes e outros agentes.

Dessa forma, recomendamos a discussão, problematização e sistematização de metodologias voltadas para o trabalho com audiovisual no currículo escolar, compartilhando estratégias metodológicas já desenvolvidas e fomentando novas possibilidades pedagógicas no campo do cinema e educação.

Destacamos a pertinência da abertura de editais públicos que garantam a transversalidade de recursos ministeriais, com o objetivo de fomentar novos projetos comprometidos com a formação docente para essa nova realidade. Novamente, cabe à universidade e seus pares organizar este saber e, ainda mais, criar espaços de interlocução com os professores da educação básica estimulando a participação ativa na construção desse conhecimento.

10) Fortalecimento de uma política latinoamericana de cinema e educação;

Tendo em vista os princípios inspiradores e estruturantes da Rede KINO, desde sua fundação até os dias de hoje, é imprescindível que haja o fortalecimento contínuo e sistemático desta Rede, de modo a viabilizar a troca de experiências; a articulação para criação de trabalhos conjuntos e o intercâmbio entre os países latinoamericanos, reafirmando o compromisso de todos os membros da Rede com o lugar do cinema e demais formatos do audiovisual nos diferentes projetos educativos.

Ressaltamos a importância do envolvimento das mais diversas instâncias governamentais dos países que integram a Rede, no sentido de comprometer o Estado como agente decisivo para o fortalecimento e continuidade de politicas públicas relacionadas ao âmbito do cinema e da educação, possibilitando um acesso amplo aos bens culturais produzidos na esfera do audiovisual.

*

Por fim, enfatizamos que esta carta encaminha ações e propostas, fruto da reflexão e crítica construída de forma coletiva pelos membros da Rede KINO nos últimos anos. Cabe ao Estado e seus agentes certamente compreender a relevância desses elementos e oferecer espaços para seu debate, crítica e transformação.

Convidamos também os outros setores e seus representantes a compartilharem conosco suas impressões e posicionamentos a respeito da Lei 13.006, de modo que a regulamentação venha ao encontro do desejo de todos e não reflita novamente a expressão da vontade de poderes hegemônicos. Ao encontro daqueles que acreditam e investem suas forças diariamente na transformação da educação no Brasil.

Ouro Preto, 22 de junho de 2015.

Rede Kino
Rede Latino Americana de Educação, Cinema e Audiovisual